domingo, 15 de junho de 2008

Produção baixa

Passo por um período de transição terrivelmente árido. Faltam-me vocábulos suficientes, para expressar meus pensamentos, sempre muitos, sempre salientes, sempre vorazes. Minha produção baixou muitíssimo! Dos trinta textos diários, restaram doze ou treze, no máximo, a me brotar dos poros. O resto é vazio. Um enorme vazio, cheio de nada.
Ainda se houvesse uma palavrinha aqui, uma expressão curta ali, leve que fosse, ácida que fosse, cortada que fosse, eu conseguiria dar-lhe forma e sentido, a ponto de transformar o pouco nalguma frase a ser mastigada pela caneta.
Nada.
Se há nada, fica difícil preencher o vácuo da folha em branco, onde dança uma caneta azulada, a desenhar traços de mulheres nuas. Mas isso não é poesia! Mas isso não é arte! Mas isso não é produção que se apresente, ora bolas!
Onde foram parar meus mais de trinta textos diários? Em que penas eles pousaram? Em que folhas brancas mancham de vermelho os meus verbos suados?
Aridez completa das minhas horas. Não tenho o que dizer, nem como fazê-lo. As vivências não me chegam. Não me brotam os versos. Os brotos não dão flores, muito menos frutos, quem dirá sabores...
Quebro um copo na cozinha. Corto o dedo. No sangue que me esvai, a palavra que eu não tinha. Ai, ai, ai...
Deserto criativo. Criação sem cria. Até quando a aridez desse período de transição, que eu não sei pra onde e muito menos porquê?

Cortem a cabeça dela!

O que seria de Alice, caso os guardas-cartas-de-baralho a tivessem alcançado, cumprindo, assim, a ordem da Rainha de Copas? O que seria de nós, leitores vorazes das aventuras alheias?
E se a lua fosse feita, mesmo, de queijo? De onde teria saído tanto leite? Da Via Láctea, certamente. Nenhuma dúvida quanto a isso. Então... Cortem a minha cabeça!
E se meu coração falasse, ao invés do meu fusca, o que ele teria pra dizer? Absolutamente nada, suponho, além de um longo e claro gemido. Talvez até um gemido de adeus. Sem discursos intermináveis. Isso ele deixaria para alguns presidentes de países não tão distantes ou de entidades não tão confiáveis. Caso ele resolvesse falar qualquer vírgula a mais do que esse tal suspiro, seria perfeitamente possível que alguém, no meio da multidão, imediatamente, e não sem razão, gritasse: "Cortem a cabeça dela!", e teria eco imediato.
O que seria de nossos mendigos sem as calçadas frias para dormir? Sem o governo a lhes prometer um mundo de nadas, sem nossas cabeças pensantes a virar para o outro lado? O que diriam eles, se pudessem dizer, se pudessem ser ouvidos, se pudessem ser levados a sério, se tivessem vez? E se não têm nada disso, deve ser porque, algum dia, alguém foi atendido ao gritar: "Cortem as cabeças deles!".
O que seria do nosso país inteiro, sem os escândalos envolvendo as chamadas celebridades, os questionamentos sobre a masculinidade deste, daquele ou daquele outro, quem ficou com quem na festa de anteontem, e na de ontem, e na de hoje, e na que está a acontecer agora, e na que ainda acontecerá em seguida, ou no ano que vem? Quem teve filho de quem, quem dormiu com quem e quem usou essa posição, essa calcinha, essa samba canção; quem vestiu a roupa da grife tal, quem siliconou mais uma parte do corpo, que tatuagem ocupou maior espaço na pele, com quantos piercings se faz um bom sexo, com quantos papelotes se perde a cabeça de vez?
O que seria do nosso país sem a violência absurda, sem a polícia bandida, sem os meios de comunicação que cortam aqui, cortam ali, cortam acolá e transmitem o que querem, quando querem a um deus-dará?
Afinal, quem se importa mesmo? O mais urgente, o que realmente interessa, é tudo isso que está aí: os escândalos, o futebol, a novela, a droga, a violência, a maledicência, a falta de informação, a informação fragmentada, a informação deletada, a informação manca, a informação formatada em forma de adaga. Pra quê? Ora, não seja ingênuo, caro e-leitor. Para cortar a sua cabeça, é claro, por que outro motivo seria? Nesse país de cartas de baralho, a Rainha de Copas já foi operária, e sabe muito bem da urgência de cortar a cabeça de quem digita números nas cabines e-leitoreiras (sim, eu sei a diferença, mas minha cabeça foi cortada há muito tempo, perdoem-me senhores e-leitores)!
CORTEM A CABEÇA DELES TODOS!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!