segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Crônica/Carta

Hoje tive uma grata surpresa: reencontrei minha filha virtual, Luzinha. Chorei, de alegria. E fiquei me perguntando como é possível a gente gostar tanto assim de alguém com quem nunca se esteve, de fato.

Os amigos virtuais não estão pertinho, e faço questão de citar aqui os que amo há anos (e não foi da noite pro dia, nem com uma conversinha superficial que me apaixonei por eles. Foram horas a fio, de longas conversas, sobre os mais diversos assuntos). Naldo, que a poesia me trouxe, e que já morreu de rir dos sanduíches enormes, que eu costumo devorar toda hora. Fabi, meu irmãozinho querido, que não acredita em amizade verdadeira dos outros; na minha ele acredita (e diz que não, pra ver). Roberto, que um dia ganhará o Nobel da Literatura e com quem aprendo muito. Cadu, meu "careta" preferido, que será pra sempre meu louco amor, graças ao Teatro Mágico. Aliás, o Teatro Mágico (sim, essa "trupe" mesmo!) me trouxe outros amigos maravilhosos: Tiago, meu pequeno príncipe dos laranjais, o mistério personificado e com certeza o homem mais decente que já conheci; Luzinha, minha filha virtual, suave e sonhadora; Re, a ovelha incandescente, inteligente até não poder mais, sangue quente, que eu adoro; Mari, a profe menina, de Imperatriz.

Sim, é possível construir uma história longa, bonita e verdadeira, com quem nunca se viu e, ainda que nos percamos de vista, de vez em quando, por esses hiatos da vida real, ela, a própria vida, dá um jeitinho de nos aproximar de novo. Porque História é algo precioso demais, pra se perder por aí.

Naldo, Fabi, Roberto, Cadu, Tiago, Luzinha, Mari e Re, o tempo vem provando que laço, real ou virtual, exige Verdade (falei isso para um novo amigo, hoje; amigo esse que, espero, chegue a ser, um dia, tão próximo de mim quanto vocês). Que bom que a gente tem sabido manter esse laço.

Amo vocês!

Sofrer é perda de tempo

Tem muita gente que não sofre mais. Minha amiga, Regiane, é uma. Eu sou outra.

Não tenho mais paciência, e, confesso, nem tempo útil, pra ficar me derramando em dores, por algo que não tem volta. Amores existem pra serem livres, e é natural que, lá pelas tantas, um dos dois resolva alçar voo e conhecer outras paragens, sozinho. Ninguém gosta de ser aquele que ficou, é óbvio. Mas, daí a perder meses choramingando, ou mesmo dias, quebrando a cabeça à procura do que se fez de errado, querendo saber o que "ela tem que eu não tenho", porque ele não me amou o suficiente, porque eu não fui a primeira e inquestionável escolha dele, não, né? Foi-se o tempo...

Acontece que o sofrimento não se restringe às relações amorosas. Ele vem embutido nas preocupações do cotidiano, nas eventuais desavenças com amigos, na falta de dinheiro, na inconstância da vida. E é aí que eu aprendi a me agarrar: na inconstância de tudo. Lulu Santos, que eu adoro, cantaria: "Tudo o que se vê não é igual ao que a gente viu a um segundo; tudo muda, o tempo todo, no mundo!" e, se muda, com que cara a gente vai querer que as coisas não nos surpreendam? E se existem surpresas boas, porque não haveria as ruins? Não gostar é uma coisa. Sofrer é outra, bem diferente. Gastar tempo sofrendo é uma terceira, e é essa que eu cortei da minha vida. Chega.

Hoje, faço tudo o que estiver ao meu alcance, pras coisas darem certo. A minha parte está feita. E caprichadinha. Se não deu, paciência. Os olhos de fora querem ver como conformismo? Que seja. O fato é que me sinto mais feliz e bem resolvida, assim. Não preciso mais guardar mágoas, nem disfarçar os olhos inchados, nem recuperar o tempo que perdi, arrasada, porque isso ou aquilo não correu conforme eu pensara. Aos 45, descubro que nada é conforme o que se pensa. Absolutamente nada. E é muito mais comum as coisas darem errado, que certo, porque há inúmeras variáveis, qualquer que seja o assunto.

Não sou assim tão pessimista, embora já tenha sido menos. Apenas vejo tudo com outros olhos, hoje. Talvez eu tenha perdido, sim, uma parte importante de doçura, que já tive, ou o saltitante entusiasmo, que, durante longos anos, me foi característico. Ganhei, com essa perda. Ganhei um tempo precioso e um pé e meio, no chão (afinal, embora o entusiasmo não seja mais assim tão saltitante, ainda me habita), desde que decidi não sofrer mais. Nem por mim (porque sou maior e melhor que qualquer motivo que me provoque dor), nem por ninguém.

Eu disse, outro dia, e repito, cada vez mais consciente de que isso é verdadeiro, sim, pra minha vida: O que não me mata, não me deixa mais forte; me deixa invencível.

Tem gente que não sofre mais. Eu sou essa gente.

Não quero enriquecer

Sabes aquela gente que quer te enriquecer a todo custo? Mas e se eu simplesmente curtir essa minha miséria? Esses caras não entendem que eu não quero morar numa mansão, não tenho a menor necessidade de ter um carro importado que nem foi lançado ainda, não estou nem aí pra cruzeiros (aliás, enjoo pacas, em barquinho, imagina num naviozão daqueles, tchê!), não quero nem saber de entrar numa loja e ir comprando tudo o que me der na telha, sem nem perguntar o preço, nem me passa pela cabeça ter, em casa, as obras dos meus escultures, pintores, músicos, escritores, preferidos.

Essa coisa de ter grana não está com nada. Os tais que vivem mandando torpedos pro meu celular, querendo que eu vá retirar o carro ganho nas promoções nas quais nunca me inscrevi, não entendem que meu negócio é suar; contar as moedinhas, do começo ao fim do mês; ficar namorando determinado objeto de longe, porque não tenho cacife nem pra chegar perto da vitrine, quanto menos adquirir o "bichinho"; morrer de vontade de conhecer Paris, e catar imagens da cidade, no Google, pra sonhar, feliz.

Que graça tem ir correndo receber os milhões que só falta ter o número da minha conta, pra que sejam meus? Assim tão fácil? Ah... assim não tem graça! Bom mesmo é ir juntando tostão a tostão, abrir uma poupança pequerrucha e saber que ela jamais vai crescer. Divertido de verdade é jogar na mega sena e acreditar que dessa vez, vai. E não ir. Isso é que é bom! O resto é bobagem.

Por isso, caras pessoas de bom coração, que insistem em me enriquecer, por favor, desistam. Sou turrona, gosto de passar trabalho, de ir de ônibus até meu "serviço", de ser uma eterna funcionária pública, de ter conhecido no máximo cinco cidades, além da minha, de ler e-books grátis, e levar minha filha pra jantar fora só uma vez por mês (sempre no pagamento).

Desistam. Não gastem tempo, lotando minha caixa de mensagens, com essas, que vocês consideram boas notícias. E devem ser mesmo, pra maioria das pessoas. Pra mim, que gosto de ser pobre, que tenho paixão por tudo o que o dinheiro não compra, essas histórias só gastam minha beleza já tão pequena. Melhor: quando eu ganhar de novo (e tenho uma surpreendente sorte nessas coisas nas quais nunca me inscrevi), transfiram todo o prêmio para os nomes de vocês mesmos. Estou publicamente dando-lhes permissão para tal (e o que se manifesta na Internet, fica pra sempre). Dividam o prêmio, rasguem ou queimem o dinheiro, ajudem uma velhinha, enriqueçam alguém mais ambicioso. Eu, não. Eu gosto mesmo dessa minha pobreza.

Madrugar





Minha irmã disse, essa semana, que meu fuso horário é outro. Pretendeu ser uma piada, mas desconfio ser a mais pura realidade. Sim, eu madrugo. Enquanto meus iguais deitam as cabeças nos travesseiros macios e mergulham num merecido descanso, eu desperto. Mereço o descanso, também, diga-se de passagem, mas o meu só chega quando os outros estão levantando, para sua lide diária. Aí é que eu deito. Madrugo.

Madrugo, porque as madrugadas me ganham. Elas e seus profundos silêncios. Elas e suas criaturas misteriosas, plenas de perguntas, sedentas de tudo, secas de nada. Madrugo, porque a escuridão é uma espécie de luz ao contrário, que me inflama de vontades, as mais diversas. Talvez, de todas, a mais importante seja a vontade de escrever. De expressar o que é praticamente inenarrável, em poemas quase sem pé nem cabeça, ou talvez poemas centopeicos, com sete cabeças, não sei...

Se rabisco ideias e pensamentos durante o dia, é nas madrugadas que eles tomam corpo e viram taça de vinho. O maior dos milagres. Quase tão grande quanto o milagre da vida: dar corpo a um pensamento e dele embriagar-se.

No entanto, de fora, acostumados ao fuso horário local, eles, os outros, entendem como preguiça o sono que chega no início da manhã. Não interessa se a noite foi fértil, se exigiu esforço, se produziu parte da obra de uma vida inteira. Interessa, isso sim, que eu durma, enquanto o mundo (esse ao qual pertenço) começa um milhão de afazeres. E as vozes repetem a ladainha de sempre, a mesma que cobra ritmos e horários iguais para todos. Uniforme.

Alheia (pero no mucho) ao reboliço provocado, recolho-me à minha insignificância justamente quando eles, os outros, acordam para a vida. E sempre vou pela sombra, já que é nas sombras que habitam meus verbos mais preciosos. Os mesmos que matam-me a gana de dizer: meu fuso horário é outro! E  que seja o que tiver de ser...

Madrugo.